2 de nov. de 2003

Autor de frases como "A verdade em economia está nos manuais do liberalismo. Desenvolvimento é sinônimo de Estado mínimo: é essa a suprema verdade", José Nivaldo Gomes Cordeiro,economista, cristão e mordaz crítico de Marx, é articulista para vários sites da internet e é especialmente conhecido pelos artigos que divulga via correio eletrônico, onde tece mordaz críticas sobre o debate econômico nacional e defende com unhas e dentes o liberalismo econômico. Mestre em Economia, com mestrado em Administração de Empresas na FGV-SP, Nivaldo Cordeiro além de profundo conhecedor do cristianismo e da filosofia ocidental, se posiciona como um autêntico liberal da tradição clássica. Segundo ele, "os economistas viraram sacerdotes e escribas do Estado moderno".

Tendo ministrado aulas em conceituadas escolas como a FGV-SP, a PUCSP e a FAAPP, argumenta que para alavancar o desenvolvimento do Brasil se faz necessário a urgência na redução da máquina pública aliada com a queda brusca na carga tributária. Sobre a ALCA, enfatiza: "Um acordo mediano é preferível a nenhum acordo". Segundo o economista, que teve ironicamente o intervencionista Bresser Pereira como orientador de suas teses na FGV (o doutorado fez apenas os créditos), o Brasil precisa de uma revolução liberal, afirmando incisivamente que é falso dizer que o Brasil aplicou o liberalismo na década de 90. Além disso, indo contra a corrente, Nivaldo Cordeiro não vê bons ventos para a economia Brasileira. Confira a entrevista.


Lucas Mendes - Parece haver um consenso entre os economistas e analistas de mercado sobre a perspectiva de um crescimento significativo da economia brasileira já a partir do ano que vem. Como o Sr. vê este otimismo?

JNGC - Vejo dois cenários alternativos. O mais realista é termos uma bolha de consumo puxada pelo afrouxamento da política monetária, que vai durar até abalar o saldo da balança comercial, quando o governo precisará aplicar novamente um novo choque de juros. Nesse cenário a inflação sobe até o momento em que o governo segure novamente o crédito. Essa bolha deve durar até o início do primeiro trimestre. A suposição é que não haverá movimento especulativo contra a moeda brasileira. O segundo cenário é mais pessimista. A bolha de consumo que está sendo criada pode soltar forças reprimidas e incentivar a fuga de capitais. A partir desse momento nem mesmo uma política de taxa de juros mais elevada poderá evitar uma situação confusa e insegura para os investidores internacionais. No primeiro cenário o PIB poderá crescer não muito além dos 2%. No segundo, só Deus sabe. Talvez repitamos a taxa do ano em curso, próxima de zero. Sou pessimista, portanto. O Brasil só poderá voltar a ter crescimento sustentado com uma profunda reformulação do Estado, inclusive com redução paulatina e significativa da carga tributária. Como as forças políticas que controlam o poder não querem essa solução, estamos condenados à recessão por um bom período de tempo.

Lucas Mendes - A imprensa tem regularmente feito associações entre a queda da taxa de juros básica, a Selic, e o crescimento econômico do Brasil. Em que medida a redução da taxa de juros Selic pode influenciar o crescimento econômico do País?

JNGC - Há dois impactos positivos. O primeiro é reduzir o dispêndio do Estado com a remuneração da dívida pública, abrindo espaço em outras rubricas para maiores gastos ou a obtenção de a um superávit primário maior, o que seria bom. O segundo é redução na ponta final do custo do financiamento. Este último é menos intenso porque a intermediação financeira no Brasil é de tal forma irracional, com o Estado absorvendo a maior parte da poupança finaceira, que os juros não podem cair significativamente. Crédito é sempre uma solução passageira, uma antecipação de gastos da renda futura para o consumidor. Gera uma bolha temporária de consumo que logo se esgota. É positivo, mas não resolve grande coisa.

Lucas Mendes - A seu ver, teria algum ponto crucial para a retomada do crescimento econômico e do desenvolvimento sustentável que o governo Lula não está dando a devida atenção?

JNGC - Sim. O nó górdio é o excesso de gastos públicos, que determina a elevada carga tributária e a ampliação da dívida pública, fazendo com que a poupança financeira seja absovida pelo Estado. Em suma, (o excesso de gastos públicos) impede a formação de poupança, seja por parte dos agentes privados, seja do próprio setor público, que realiza gastos de qualidade duvidosa, basicamente em consumo corrente, nada sobrando para investimentos. Enquanto essa situação não for resolvida - a do volume de poupança macroeconômica - não há como haver retomada dos investimentos nos níveis requeridos para sustentar o desenvolvimento. É uma conclusão lógica que se impõe. Em paralelo, o Brasil padece de séria restrição externa, que impõe a necessidade de geração de elevados superávits na balança comercial. Uma retomada sem reforço nos investimentos só pode ser feita mediante sacrifício desse saldo, que o fatalmente levará a uma crise cambial, de difícil superação.

Lucas Mendes - Então o grande problema que afeta o Brasil é exatamente o peso do Estado sobre a atividade econômica. Por isso o Sr. sugere medidas baseadas no ideário liberal para solucionar o problema econômico do Brasil. Mas a maioria dirá que o Brasil na década de 90 aplicou o neoliberalismo e que ele teria sido catastrófico. O que o Sr. teria a dizer sobre essa acusação comum no debate econômico nacional?

JNGC - Definitivamente é falso dizer que o Brasil aplicou o liberalismo nos últimos anos. O que foi aplicado foi a coerência na administração econômica, respeitando-se alguma das suas leis fundamentais, uma delas a boa administração dos orçamentos públicos, no sentido de buscar o equilíbrio. Isso não se confunde com liberalismo. Embora respeite essas leis econômicas, o ideário liberal prega o Estado mínimo, com o mínimo de tributação, o mínimo de ingerência na vida econômica. O que vimos? Exatamente o oposto disso, com a supertributação, com o excesso de regulação, com o uso de instrumentos para se manter o Estado máximo. Na verdade, o que se chama de liberalismo é o respeito às leis naturais da vida em sociedade, pelo qual se consegue o máximo de liberdade e de prosperidade econômica. Essa forma de organizar a sociedade está de acordo com a tradição cristã, de respeitos aos valores individuais com responsabilidade, com liberdade, sendo o indivíduo a instância suprema de consciência. É absolutamente essencial separar o poder político do poder econômico, sob pena de se criar as condições para a implanação de tiranias abertas ou disfarçadas, como a que vemos no Brasil de hoje, onde todo mundo ficou escravo do Estado via sistema tributário. Precisamos fazer a revolução que jamais foi feita no Brasil: a revolução liberal.

Lucas Mendes - Porque os economistas brasileiros não se detem a questão da redução do Estado, dos elevados e ineficientes gastos públicos e da atrofiante burocracia? Até mesmo o debate acadêmico aborda essa perspectiva de forma muito tímida, ao mesmo tempo em que a questão do controle estatal da economia está cada vez mais presente e até a idéia do planejamento ganhou fôlego de uns tempos para cá. A boa teoria econômica não vislumbra que seria ainda mais grave para a economia a implementação ou o aprofundamento dessas medidas?

JNGC- O planejamento econômico é a ferramenta principal do intervencionismo econômico. É sabido que o Estado não pode prever é incapaz de prever a vontade, os desejos e as necessidades dos cidadãos e estou convencido que políticos propõem isso por isso dá poder. O plenjamento, especialmente quando fundamento em uma ordem tributária tirânica, une poder político com o poder econômico. Veja o programa Fome Zero. A economia brasileira está impossibilitada de gerar empregos porque o Estado tributa demais, mas ao invés de reduzirem os impostos, os políticos no poder vêem com essas idéias mirabolantes, que sempre redundam em mais impostos e em mais intervenção do Estado. Nunca resolverá o problema da fome, mas com certeza dará mais poder ao estamento burocrático-político e mais votos de cabresto nas próximas eleições. É uma lógica infernal em que o econômico se transforma em um instrumento de cominação por parte de espertalhões que querem ganhar as eleições. O que é boa teoria econômica? para um keynesiano e uma marxista, é o planejamento e o intervencionimos, para o liberal o contrário.


Lucas Mendes - Marcello Tostes, economista e colunista do jornal eletrônico O Indivíduo (www.oindividuo.com) escreveu um artigo com um título um tanto hilário, senão, provocador: Os economistas e o poder do Estado: um verdadeiro caso de amor. Esse fenômeno já não teria causado estragos na economia brasileira suficientes para que esse caso rompesse?

JNGC - O Marcello escreve textos saborosos e tem uma perspectiva aguda da nossa sociedade. Ele está certo. Economistas, especialmente os de esquerda, viraram sacerdotes e escribas do Estado moderno. São os acólitos do poder absolutista renascido. Estraga-se não apenas a economia, mas a liberdade, a alma dos indivíduos, sacrifica-se a verdade aos interesses mesquinhos.

Lucas Mendes - Então seria daí que deriva a pouca adesão ao liberalismo pelos cientistas sociais?

Os cientistas sociais já são uma outra questão. Esse curso no Brasil, que forma os profissionais da área, com as exceções de regra, viraram treinadores de quadros revolucionários marxistas. Já as ciências sociais, no seu sentido amplo, incluindo os economistas, estão hoje contaminadas pelo viés esquerdista e estatista. Marx tomou conta do coração e das mentes dessas pessoas. Querem cada vez mais o Estado intervindo na vida das pessoas e estão conseguindo transformar no contidiano de todos em um inferno. É só ver a tragédia do desemprego para se ter noção do crime de lesa-humanidade que estão comentendo, um verdadeiro crime.

Lucas Mendes - Mas Marx repudiava o Estado "agente de opressão da burguesia".

JNGC - Marx era um sujeito que odiava a civilização ocidental e queria destruí-la. Era um ressentido e um rancoroso e tudo que queria era moldar o mundo à sua imagem e semelhança, isto é, aos seus ódios e suas distorções. Paul Johnson, no livro Os Intelectuais, insinua que a obra de Marx é uma mixórdia desconexa, feita com grandieloquência que engana os incautos. Fundou-se em dados falsificados e não tem uma lógica. Ele queria mesmo é transformar o mundo e tudo que escreveu não passa de panfleto primário em busca desse objetivo. Na sua obra ele tanto ataca o Estado como o quer usar para fazer a revolução. Como ele nunca compreendeu a realidade, ele achava que o Estado era controlado pela burguesia, embora intuisse que esse poder fosse compartilhado com os remanescentes da aristocracia. Na verdade, o socialimo é uma degeneração das idéias liberais que combatia o Estado absolutista. Marx não compreendeu isso jamais. Era um amoral, um homem mentalmente e moralmente doente.

Lucas Mendes - O Sr. não acha que a aversão ao liberalismo e as idéias capitalistas são formadas nas faculdades?

JNGC - Sim, mas não apenas. Nas igrejas, nas escolas de nível fundamental, nos meios de comunicação. Estamos vivendo a plenitude da revolução gramsciana, pela qual se faz a revolução por dentro, em doses homeopática, acabando com a liberdade interior das pessoas, com a própria capacidade de pensar. Alguém sensato jamais votaria em um Lula, por exemplo. Há um adestramento coletivo em rumo do coletivismo e para isso é preciso sacrificar a verdade, isto é, o liberalismo, no âmbito econômico, e a religião, no âmbito da tradição. No caso, o cristianismo, religião professada pela maioria, mas não apenas.

Lucas Mendes- O Brasil preside junto com os EUA as negociações em torno da ALCA (Área de Livre Comércio das Américas) que deverá entrar em vigor em 2005. Qual a importância da ALCA para o Brasil?

JNGC - Toda importância. O Brasil precisa se integrar à economia internacional e o principal parceiro são os EUA. É um erro crasso não fazer o acordo. A nosso diplomacia hoje é uma caricatura de grêmio acadêmico colegial, que elegeu os EUA nossos inimigos. Não são. São parceiros, os principais.

Lucas Mendes - Quer dizer que a ALCA seria boa para o Brasil independente dos termos de negociação?

JNGC - O Brasil não poder perder o bonde andando. Negociar significa defender pontos e aceitar pontos de vistas dos outros. Não se pode ir para a mesa de negociação com questão fechada como se fosse princípios. Um acordo mediano é preferível a nenhum acordo. E o Brasil não pode querer tomar a liderança do processo. Os EUA são os líderes naturais, o que não significa que o Brasil não tenha peso. O que não pode é a nossa diplomacia se comportar toda cheia de não me toque, qual mulher jovem não iniciada.

Lucas Mendes - Como o Sr. avalia o atual processo de negociação da ALCA pela diplomacia brasileira?

JNGC - Um desastre. Se não houver correção de rumos, ficaremos de fora e viraremos párias no comércio internacional.

Lucas Mendes - Que autores o Sr. acharia essenciais ao público brasileiro, em especial aos estudantes de economia que estão imbecializados com o consumo excessivo de literatura intervencionista e anti-liberal?

JNGC - Hayek, Mises, Friedman, Aron, Paul Jonhnson, Meira Penna, Olavo de Carvalho, Roberto Campos. Aí tem leitura para um lustro inteiro.

Visite o sítio na internet de Nivaldo Cordeiro: http://geocities.yahoo.com.br/nivaldocordeiro/